terça-feira, 30 de abril de 2019

ULTRAPASSAMOS A 70.000 VISUALIZAÇÕES!!!!


Que palavras posso dizer a todos vocês, amigos e amigas de Panorama do Cinema, que já não tenha dito por sua confiança neste modesto - mas, feito com muito amor - espaço sobre cinema? Apenas duas, mas que dizem tudo sobre este momento:

MUITO OBRIGADO!!!

Que tal uma taça de champagne para comemorar?


sexta-feira, 26 de abril de 2019

Crítica: Pantera Negra | O Poder Negro Afrofuturista


Atualizado em 13/06/2021

OSCAR 2019: venceu nas categorias melhor trilha sonora,  figurino e design de produção.

Como todos sabem, a década de 1960 foi uma época de grandes e decisivas mudanças no mundo. Dentre essas mudanças estava a igualdade de direitos civis aos negros nos EUA. Esse movimento tinha duas vertentes: uma, liderada pelo pastor batista e vencedor do Prêmio Nobel da Paz Martin Luther King (1929-1968), que, inspirado pela Bíblia Sagrada e pelas ideias do líder político e espiritual indiano Mahatma Gandhi (1869-1948), tinha como método de luta a não-violência e o amor ao próximo.

A outra vertente era liderada pelo líder muçulmano Al Hajj Malik Al-Shabazz, que passou à história como Malcolm X (1925-1965). Essa vertente criticava os métodos de Luther King - considerados passivos - e defendia a violência e o uso de armas como método de autodefesa, mas não de ataque.

O ano de 1966 foi particularmente agitado para o Movimento Negro. Foi nesse ano que Stockley Carmichael, um militante negro radical, ao ser preso pela 27ª vez, deu a seguinte declaração:

"Estamos gritando liberdade há seis anos. O que vamos começar a dizer agora é: Poder Negro".

Nesse mesmo ano, inspirado por Malcolm X e pelo maoísmo - vertente chinesa do comunismo baseada nas ideias do revolucionário Mao Tsé-Tung (1893-1976) - os ativistas Huey Newton e Bobby Seale fundaram o Partido dos Panteras Negras

Os Panteras Negras ficaram conhecidos pelos seus confrontos com a polícia (o diretor do FBI, o famoso John Edgar Hoover, chegou a dizer que os panteras eram "A maior ameaça à segurança interna do país"), mas também pelos seus programas sociais comunitários como, por exemplo, clínicas de saúde. Um de seus membros mais conhecidos era a ativista Angela Davis (1944- ) sobre quem há o interessante documentário Libertem Angela Davis (2012).

Os Panteras Negras tiveram seu auge no início da década de 1970, quando houve o julgamento de Angela Davis, e, depois, começou a declinar até o partido ser extinto em 1982. Em 1989, foi fundado o Novo Partido dos Panteras Negras para Autodefesa, que os antigos panteras chamam de "ilegítimo".

No mesmo ano de 1966, o escritor Stan Lee e o desenhista Jack Kirby criaram o super-herói negro Pantera Negra. Lee, até hoje, jura que a escolha do nome do personagem nada tinha a ver com o partido e que foi uma "estranha coincidência". 

Há aqueles que afirmam que a origem do nome teria sido por influência do maior futebolista português em todos os tempos, Eusébio (1942-2014), artilheiro e melhor jogador da Copa do Mundo de 1966, e que também era conhecido justamente pela alcunha de "O Pantera Negra".

O Pantera Negra não foi o primeiro super-herói negro. Já haviam aparecido personagens assim desde a década de 1940, mas sem superpoderes, sempre muito caricatos e nunca como protagonistas. O Rei de Wakanda inovava por ser radicalmente o oposto de seus antecessores.

Pantera Negra inicia contando a história do Reino de Wakanda, na África, onde, há milhares de anos atrás, caiu um meteorito repleto de vibranium, um metal duríssimo, durante uma guerra tribal. Ao final do conflito, todas as tribos, exceto uma, reconhecem o guerreiro chamado de Pantera Negra como seu rei.

O vibranium ajuda no grande desenvolvimento de Wakanda, que, devido às infindáveis guerras que ocorriam ao seu redor e ao modo como o povo negro era tratado pelas outras raças, isola-se do resto do planeta que pensa que o reino é um país pobre do Terceiro Mundo como tantos outros.

No século XX, em 1992, o rei T'Chaka (John Kani, de Coriolano) vai aos EUA encontrar-se com seu irmão, N'Jobu a quem acusa de ter vendido vibranium ao contrabandista de armas sul-africano Ulysses Klaue (Andy Serkis, da franquia Planeta dos Macacos). As acusações são confirmadas por um espião.

Após a morte de T'Chaka, seu filho, T'Challa (Chadwick Boseman, de Get On Up: A História de James Brown), torna-se o rei de Wakanda. Nesse meio tempo Klaue e Erik "Killmonger" Stevens (Michael B. Jordan, de Creed - Nascido Para Lutar), um ex-agente da CIA, roubam um artefato wakandiano de um museu e viajam para a Coréia do Sul para tentar vender o produto do roubo para Everett K. Ross (Martin Freeman, da série Sherlock), um agente da CIA. Klaue é preso por T'Challa, mas é libertado por Erik. Ross é gravemente ferido e T'Challa o leva para Wakanda para curá-lo.

T'Challa interroga Zuri (Forrest Whitaker, de Rogue One - Uma História Star Wars. Veja a crítica aqui), um antigo servo de seu pai, sobre N'Jobu. Zuri conta que N'Jobu planejava vender tecnologia de Wakanda para os afrodescendentes ao redor do mundo para iniciar uma guerra contra seus opressores. Erik aparece, revela ser o filho de N'Jobu, desafia e vence T'Challa pelo trono de Wakanda e torna-se o novo rei.  T'Challa deve retomar seu trono para evitar Erik de realizar o plano de seu pai.

Pantera Negra retoma com força o movimento do cinema totalmente produzido e interpretado por artistas negros iniciado na década de 1970, nos EUA, que ficou conhecido como Blaxploitation (sobre o qual Panorama do Cinema falará futuramente) e que o cinema francês já vem realizando já há algum tempo como pode ser visto em duas produções realizadas em 2017: Château-Paris (veja a crítica aqui) e Uma Temporada na França (veja aqui).

Pantera Negra difere-se desses filmes franceses pelo fato de ser uma superprodução de um personagem de histórias em quadrinhos (HQ), mas assemelha-se ao mesmos por conter críticas sociais e políticas  sobre como são vistas e tratadas as comunidades negras, africanas, afro-americanas e/ou afrodescendentes, o que inclui a onda de imigrantes-refugiados que vão para a Europa - e, em escala menor, os próprios EUA - em busca de salvação e de uma nova vida tal como pode ser visto no já citado Uma Temporada em Paris e, também, em outro filme francês, Samba (2015, veja aqui), estrelado pelo ator Omar Sy (Intocáveis).

Em um sentido mais amplo, o termo afro-americano também pode ser utilizado por comunidades negras de outros países do continente como, por exemplo, o Brasil, embora aqui sejam preferidos os termos afro-brasileiro, negro ou, ultimamente, preto.

É importante dizer que, de uns anos para cá, também vem ocorrendo o fenômeno de onda de imigrantes-refugiados em terras brasileiras - que, assim como nos EUA, ocorre em escala menor em relação a Europa. Esse fenômeno pode ser visto na Grande São Paulo, principalmente na capital e na região do ABCD; e, recentemente, no estado de Roraima com a chegada de refugiados vindos da Venezuela.

As críticas sociais e políticas feitas em Pantera Negra refletem os dias atuais, pois vão desde o racismo e a intolerância até o extremismo político, o que inclui a interferência dos EUA em assuntos internos de outras nações. Aliás, esse é um tipo de crítica cada vez mais comum em filmes estadunidenses e, particularmente e curiosamente, em filmes de super-heróis como, por exemplo, o mal compreendido Batman vs Superman: A Origem da Justiça (2016). Porém, o que mais chama atenção é o conflito dos dois tipos de ideologia que dividem o Poder Negro até hoje: a de Martin Luther King (representada por T'Challa) e a de Malcolm X (representada por Killmonger, mas de modo distorcido).

É impossível não notar a estética Afrofuturista de Pantera Negra. Para aqueles que não sabem, o Afrofuturismo é uma estética cultural e filosófica de ciência, história e arte surgida na década de 1990 (com raízes na década de 1950) que combina elementos de ficção-científica, ficção histórica, arte africana - que inclui a arte da diáspora africana -, Afrocentrismo (ideologia dedicada ao estudo da história africana) e realismo mágico com cosmologia não-ocidental. O Afrofuturismo está presente em todo filme como nos cenários, figurinos, veículos, nas histórias contadas, sem falar na maravilhosa trilha sonora composta pelo sueco Ludwig Goranson.

O cineasta Ryan Coogler é um dos nomes mais recentes da nova safra de diretores negros juntamente com seu amigo Steven Caple Jr. (Creed II). Coogler fez sua estreia na direção em 2013 com o filme independente Fruitvale Station: A Última Parada, que foi o grande vencedor do Festival de Sundance daquele ano tendo conquistado os prêmio de melhor filme do júri e do público. Essa produção também marcou sua primeira colaboração com Michael B. Jordan. 

Pantera Negra é apenas o terceiro trabalho de Coogler, mas parece ser o trigésimo, pela segurança demonstrada tanto nas cenas de ação quanto na direção de elenco. Sua direção faz o filme fluir tão bem que nem parece que tem mais de duas horas de duração. Pelo que demonstra até aqui, Coogler tem tudo para ser um dos grandes cineastas dos próximos anos.

A fotografia de Rachel Morrison (Mudbound - Lágrimas Sobre o Mississipi) mostra a África não como um local de miséria e violência, como é normalmente visto pelo Ocidente, mas como um lugar belíssimo, de flora e fauna exuberantes, de cultura rica e fascinante.

Uma das grandes sacadas de Pantera Negra é o sotaque "wakandiano" (que acaba por se perder na dublagem em português) de vários personagens que lembra muito o de países africanos de língua inglesa tais como Gana, Nigéria, Quênia e África do Sul, o que contribuiu para que o filme tivesse grande aceitação no continente.

Porém, Pantera Negra não teria tido tanto sucesso se não fosse pelo seu competentíssimo elenco.

De minha parte, não consigo ver outro ator que não Chadwick Boseman para o papel-título, que lhe coube como uma luva. Sua interpretação passa todas as características que se espera desse tipo de personagem: bondoso, forte, nobre, generoso, inteligente e bem humorado.

Michael B. Jordan mostra porque é considerado um ator-sensação em Hollywood. Com a mesma convicção que fez de Adonis Creed um grande herói, faz de "Killmonger" um grande vilão. O Oscar será uma questão de tempo para este grande intérprete.

Nakia mostra que está à altura de T'Challa tanto como noiva quanto como companheira de lutas. Sem dominação ou submissão. Desde a sua vitória no Oscar de melhor atriz coadjuvante por 12 Anos de Escravidão (2013), Lupita Nyong'o não para de fazer sucesso com direito, inclusive, de participar da saga Star Wars - que terá seu próximo episódio lançado no final de 2019. O céu é o limite para ela.

Angela Bassett, Forrest Whitaker, Martin Freeman e Andy Serkis são os chamados coadjuvantes de luxo, que acrescentam experiência e brilho à produção, sendo que Serkis mostra que não é apenas um intérpretes de personagens virtuais tais como Golum (sagas O Senhor dos Anéis e O Hobbit) e Capitão Haddock (As Aventuras de Tintim: O Segredo do Licorne). Seu talento supera essas limitações.

Para mim, uma coadjuvante que destaca-se em Pantera Negra é Letitia Wright (Jogador Nº 1), que faz da sua personagem, Shuri, uma versão feminina, afro e adolescente (embora a atriz esteja atualmente com 25 anos) do armeiro do serviço secreto britânico da franquia James Bond 007,  Q (interpretado primeiro pelo saudoso Desmond Llewelyn e, atualmente, por Ben Wishaw). Além disso, ela é uma simpatia!

Na recente cerimônia do Oscar, Pantera Negra foi indicado a sete prêmios, incluindo o de melhor filme (perdeu para Green Book: O Guia), um feito inédito para um filme de super-heróis, e conquistou três (cuja relação está no início do texto). Sempre há aqueles que contestam a premiação de cinema mais famosa do mundo, mas, ainda assim e independente da quantia de prêmios conquistadas, foram vitórias justas.

Pantera Negra é um daqueles filmes que marca uma época. E nesta era das trevas que vivemos atualmente - com ascenção de governos de extrema-direita, preconceitos raciais e de gênero, e intolerância religiosa - torna-se um filme importante pela transmissão de valores bons, nobres e tolerantes, que estão cada vez mais raros em uma sociedade que torna-se mais materialista e fascista a cada dia que passa. É também um filme que transmite esperança, um sentimento que nunca devemos deixar de ter. E tudo isso vai muito além da cor da pele.

ESTE TEXTO É RESPEITOSAMENTE DEDICADO ÀS MEMÓRIAS DA VEREADORA MARIELLE FRANCO (1979-2018), DO JOVEM PEDRO HENRIQUE GONZAGA (2000-2019) E DO ATOR CHADWICK BOSEMAN (1977-2020)

FICHA TÉCNICA
  • Título Original: Black Panther
  • Direção: Ryan Coogler
  • Elenco: Chadwick Boseman (T'Challa / Pantera Negra), Michael B. Jordan (N'Jadaka / Erik "Killmonger" Stevens), Lupita Nyong'o (Nakia), Letitia Wright (Shuri), Martin Freeman (Everett K. Ross), Angela Bassett (Ramonda), Forrest Whitaker (Zuri), Andy Serkis (Ulysses Klaue), Danai Gurira (Okoye)
  • RoteiroJoe Robert Cole, Ryan Coogler
  • Música: Ludwig Goranson
  • Fotografia: Rachel Morrison
  • Duração: 134 minutos
  • Ano: 2018
  • Lançamento comercial no Brasil: 15/02/2018

          RESUMO DO FILME

Após a morte do rei T'Chaka, seu filho, o príncipe T'Challa, o sucede como soberano de Wakanda. Paralelamente, um traficante de armas e gangster estrangeiro rouba um precioso minério do país ao mesmo tempo que um ex-agente da CIA quer vingar-se de T'Challa.
 
COTAÇÃO
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Veja aqui o trailer oficial de Pantera Negra (legendado - HD):


Publicado no AdoroCinema em 26/04/2019 e no LinkedIn em 13/06/2021.