A passos lentos, mas firmes, os documentários tornam-se cada vez mais populares entre o público de cinema de todo o mundo, inclusive no Brasil. Nomes como o polêmico e genial estadunidense Michael Moore (de Tiros em Columbine, vencedor do Oscar da categoria) e a poética e sensível brasileira Petra Costa (de Democracia em Vertigem, indicado ao mesmo prêmio) ajudaram e ajudam na popularização desse gênero de filme. Os caráteres educativo, histórico, esclarecedor e revelador fazem com que abram-se reflexões, discussões e debates sobre o tema tratado. E, por vezes, tornam-se premonitórios como é o caso de O Império de Pierre Cardin.
Nascido na Itália em 1922, mas radicado na França desde os dois anos de idade (tinha dupla nacionalidade), Pierre Cardin, cujo nome verdadeiro era Pietro Constante Cardin, levou a moda a patamares até então nunca vistos e popularizou a Alta Costura com a venda de “prét-à-porter” (“pronto para usar”, em francês) em lojas de departamentos quando causou um grande escândalo – chegou a ser expulso do Chambre Syndicale, o prestigioso e influente sindicato dos estilistas franceses – ao mesmo tempo que revolucionou esse mercado tendo sido chamado de “O Socialista da moda”.
Embora sem nenhuma intenção, O Império de Pierre Cardin acaba por ser um epitáfio ao estilista, que faleceu em 29 de dezembro de 2020 (até o momento em que este texto foi escrito, a causa da morte não foi divulgada), mas um epitáfio alegre, amoroso e colorido, sem nenhuma pompa e sem ser sisudo, graças à direção leve e descontraída da dupla de diretores estadunidenses P. David Ebersole (Dear Mom, Love Cher) e Todd Hughes (Hubby/Wifey).
Apesar de ser uma figura pública mundialmente conhecida, Pierre Cardin sempre foi muito reservado quanto à sua vida pessoal, mas, ainda assim, O Império de Pierre Cardin consegue mostrar fatos da vida de Cardin tais como a vinda de sua família para a França devido à ascensão do fascismo na Itália liderado pelo ditador Benito Mussolini (1883-1945), seu início de carreira em Paris onde trabalhou, entre outros, para o afamado Christian Dior (1905-1957), a rivalidade com o grande estilista Yves Saint Laurent (1936-2008), e seu relacionamento amoroso de quatro anos com a atriz Jeanne Moreau (de Jules & Jim – Uma Mulher Para Dois), apesar de ser abertamente gay.
Há dois fatos muito engraçados em O Império de Pierre Cardin que não dá para deixar de citar: Uma, das crianças chinesas que, quando perguntadas quem era o presidente da França, responderam: “Pierre Cardin”. A outra, quando Cardin conta que, quando trabalhou como modelo, era considerado bonito e, segundo ele, “todos queriam dormir comigo”. Logo após dizer isso fica envergonhado e começa a rir de si mesmo.
Se a vida particular de Cardin tem poucos fatos, a vida profissional é largamente explorada em O Império de Pierre Cardin. Seus designs futuristas, com predileção pelas formas arrendondadas, a expansão para outros ramos de negócios além das roupas e o pioneirismo em novos mercados como Japão e China, mostram que Cardin conseguia unir sua criatividade em designs com o faro comercial de um homem de negócios.
O Império de Pierre Cardin tem várias imagens de arquivos de entrevistas (algumas inéditas) de Pierre Cardin ao longo dos anos até chegar à atualidade na qual é mostrado como um velhinho adorável que poderia ser o avô de qualquer um.
Em contrapartida, uma falha do filme é, ao mostrar as pessoas entrevistadas para o filme, não ter nenhuma legenda que as identifiquem. Com exceção de personalidades hiperconhecidas como a atriz Sharon Stone (de Instinto Selvagem), a cantora Dionne Warwick, o rockeiro Alice Cooper, o músico eletrônico Jean-Michel Jarre e o estilista Jean-Paul Gaultier, fica difícil para alguém que não está familiarizado com o mundo da moda saber quem são essas mesmas pessoas e sua devida importância.
O Império de Pierre Cardin é um tributo, como dito antes, premonitório – como se soubesse que o passamento de Cardin viria logo – e carinhoso a um já saudoso homem que tornou-se não apenas um ícone da Alta Costura, mas também das artes, da cultura e dos negócios. Quem for assistir ao filme, não irá arrepender-se, sairá bastante satisfeito da sala de exibição e gostará ainda mais do gênero documentário.
- Título Original: House of Cardin
- Direção: P. David Ebersole, Todd Hughes
- Elenco: Pierre Cardin, Jean-Paul Gaultier, Sharon Stone, Naomi Campbell, Dionne Warwick, Alice Cooper, Jean-Michel Jarre
- Produção: Cori Coppola
- Música: James Peter Moffatt
- Fotografia: Laurent King
- Duração: 97 minutos
- País: EUA, França
- Ano: 2019
- Lançamento comercial no Brasil: 14/01/2021
Nenhum comentário:
Postar um comentário